Correr 24horas…uma experiência transformadora

22/03/2020 5 Por ultragusmao

Dias após fazer minha primeira ultramaratona estava me sentindo muito bem e querendo um desafio que realmente testasse minha capacidade física. Foi então que comecei a buscar provas de ultramaratonas por todo Brasil até que descobri as 24 Horas do Fuzileiros Navais no Rio de Janeiro.

Pensei: “Uau…correr 24horas isso é uma loucura”. A ideia ficou na minha cabeça por muitos dias, alguma coisa me dizia que tinha que me inscrever, era a oportunidade de testar o verdadeiro limite do meu corpo.

Passei a pensar e conversar comigo mesmo desta forma: “Levar meu corpo ao limite me deixa de frente com meus medos e me faz acreditar que posso ir além, seguir em frente e não desistir. Descubro que tenho uma força interior que não tem limite e que me faz conquistar meus objetivos”.

Passado um mês da minha primeira Ultra, me inscrevi na 4ªUltramaratona de 24horas Fuzileiros Navais, que seriam realizadas nos dias 17 e 18 de setembro de 2011.

Aquela era a hora de começar a planejar e treinar para o desconhecido, comecei a buscar livros e artigos sobre treinamento em ultramaratona, já que no meu estado do Espirito Santo, pouco se sabia sobre treinar ultramaratonistas. Mesmo assim, muito pouca coisa eu encontrava a não ser artigos sobre lesões, o que me deixava um pouco com medo, mas sentia que aquilo era para mim e que eu deveria seguir em frente.

Resolvi usar minhas experiências como corredor e triatleta, aliadas ao que tinha aprendido na Faculdade de Educação Física sobre treinamento para montar um plano coerente, que me ajudasse a cumprir meu desafio.

Do dia em que me inscrevi até a data da prova faltavam 7 meses, tempo considerável para uma preparação, então comecei: contagem de semanas, distribuição dos ciclos de treinamentos, preparação de base, período especifico, competitivo, tudo conforme havia aprendido na faculdade. Foram meses de treinos, trabalhando com volumes nunca antes treinado, meus longos passaram a ser 50, 60,70km… Meu último longo foi de 10horas na pista da UFES (Universidade Federal do Estado do Espírito Santo) onde a proposta do treino era correr 3 horas seguidas e caminhar 30min, o que no final seriam 9horas correndo e 1 hora caminhando.

Acordei cedo peguei minha caixa térmica e parti sozinho para UFES, o treino foi super agradável, eu e a pista nos tornamos grandes amigos e ao final foram 94km nas 10horas de treino, terminei o treino empolgado e com o sentimento de que estava pronto: que viessem as 24horas!!!

Chegou a hora de encarar as 24horas, eu era um menino perto dos grandes ultramaratonistas na prova. Essa prova foi um grande aprendizado, estava ali querendo aprender sobre esse mundo novo, fazer amizades, trocar experiências.

E assim aconteceu minha primeira ultramaratona de 24 horas, conheci amigos, corredores de alma, que correm e amam o esporte de endurance: Urbano Gracco, Luciano Alves, Rodrigo Souza, Julvam Pereira, Fabio Machado, Rafael Bonato, Claudia Souto, Debora Simas, Vanderson Luiz, Eduardo Calixto, Jorge Cerqueira, Delino Tomé, Nelson “vovô”, dentre outros.

As 9 horas da manhã do dia 17 de setembro eu estava lá na linha de largada entre os grandes, de capixaba só eu e a Maria das Graças Bernadino. O início da prova foi bem tranquilo, imprimi um ritmo confortável e a ideia era ir até onde dava, fui levando a prova numa boa, mas o calor do Rio de Janeiro castigava, quando completei 60km eram 5:50h e resolvi entrar numa banheira de gelo, troquei de roupa e segui, mas num ritmo um pouco mais lento e depois dos 80km iniciei pequenas caminhadas, quando era por volta das 17horas, meu irmão, que é fisioterapeuta, e que havia chegado com meus pais no meio da competição para me darem apoio, me disse: “se quiser ir no gelo mais uma vez vai logo porque depois vai escurecer e cair a temperatura.”

Não pensei duas vezes, parei novamente no gelo e fiz mais uma troca de roupa, e voltei para prova, mas era cada vez mais difícil correr, começou a travar e doer tudo, nunca havia sentido aquelas dores musculares. O cérebro mandava correr, mas o corpo não permitia e mesmo caminhar era muito difícil. Foi então que comecei a parar a cada 2 horas para meu irmão me alongar, e depois voltava e tentava correr, cada volta eram 1,5km, tentava dar uma volta correndo e outra caminhando, mas confesso que correr era um sofrimento.

O tempo foi passando e eu seguindo aquela estratégia, até que meu Pai viu uma das últimas parciais e eu era o primeiro da faixa etária, quase não aguentava mais correr e meu objetivo agora era descobrir quem era o segundo, pois eu estava 5 voltas na sua frente.

Quando descobri que era um atleta carioca da Rocinha, começou o meu desespero, porque faltavam 2 horas para o final da prova e ele estava correndo num ritmo muito forte, uma coisa incrível para quem já havia corrido 20 horas, em 1hora ele tirou 3 voltas e na última hora a diferença havia caído para 2 voltas, foi então que algo fantástico aconteceu. Eu não sei como, a única explicação é o poder de Deus, pois tirei força de onde não tinha e comecei a correr num ritmo mais forte do que o do início da prova, era a única forma de me defender e foi assim os últimos 30 minutos foram os mais fortes da prova, o que me garantiu o primeiro lugar na faixa etária e uma marca de 177km.

Os dois grandes aprendizados desta ultramaratona de 24 horas para mim foram: (1) ninguém consegue nada sozinho, se não fosse o apoio dos meus familiares, meu irmão, meu pai e minha mãe esse sonho não seria possível; e (2) o corpo humano possui uma capacidade inexplicável, conseguimos tirar força e vencer em situações que parecem impossíveis.

Numa prova de 24horas você pode ter certeza que uma boa equipe de apoio faz muita diferença para alcançar um grande resultado. Se você não tiver uma equipe de apoio você conseguirá sim fazer uma boa prova, mas uma equipe eficiente te fará ir além.  

Essa foi a história da minha primeira ultra de 24horas, espero que tenham gostado. Conte aí uma experiência sua nos comentários. Um Grande abraço e até a próxima!